quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

França – Queijos e vinhos IV

Veja também outros posts com o tema “França”: ... porque não somos de ferro!!!, “O golpe do anel!”, Cadeados da paixão!”, Queijos e vinhos”, “Queijos e vinhos II e “Queijos e vinhos III

 
Hoje vamos falar dos queijos de sabor suave, os preferidos da Mary. Mas vou fugir dos tradicionais Brie e Camembert que você já conhece.

Pessoalmente, como prefiro queijos de sabor e aroma mais marcantes, acho a maioria dos queijos suaves bem sem graça. Mas minhas preferências estão fora da curva padrão do consumidor brasileiro, onde provavelmente você se encaixa.
Para mim, quanto mais mal cheiroso, mais gostoso é o queijo!
Para mim, entre os queijos suaves, o Reblochon de Savoie é disparado o meu preferido.

A história do Reblochon é curiosa. No final da Idade Média, os produtores leiteiros da região de Savoie entregavam boa parte de sua produção aos senhores feudais. Para "diminuir" sua produção, eles não ordenhavam completamente suas vacas. Depois que os fiscais iam embora, os produtores completavam a ordenha. Ou seja, eles "re-blochaient" suas vacas. É o leite dessa segunda ordenha, mais rico, cremoso e encorpado, que é usado para fazer esse delicioso queijo.
Reblochon de Savoie
Os queijos são colocados para secar em porões, virados a cada dois dias e lavados com soro de leite para acelerar o processo de maturação.

O resultado é um queijo extremamente cremoso, mais até que o Brie. Têm coloração amarelada e sabor ligeiramente adocicado. O Reblochon de Savoie vai muito bem com um vinho branco suave ou tintos leves como o Beaujolais.
Reblochon: deliciosamente cremoso
Outro queijo suave que eu adoro é o Fol-Epi, também conhecido como o Emmental francês. Seu nome significa, em francês, ramo de trigo.

Produzido no Vale do Loire é montado em rodas de cerca de 3 quilos adornadas na superfície de sua casca com a imagem de ramos de trigo, uma lembrança da farinha de trigo torrada que cobre a casca desse delicioso queijo.
Fol Epi, o Emmental francês
Os buracos do Fol-Epi são bem menores e menos marcantes que os encontrados no suíço Emmental ou no holandês Maasdam.  É feito com leite pasteurizado de vaca, maturado por apenas 3 meses e tem sabor leve e adocicado, lembrando um pouco avelã, sabor esse que vem do trigo de sua casca.

Vai muito bem com vinhos brancos Riesling, Chardonnay ou Sauvignon, assim como com tintos leves tipo Merlot e Pinot Noir. É uma delícia acompanhado com pão, amêndoas e frutas secas.
O ramo de trigo na casca é a marca registrada do Fol Epi
Outro dia estava dando uma olhada na seção de queijos de um supermercado de Brasília e vi algo que deu vontade de rir. Um queijo Morbier fatiado na sua metade longitudinal, ao contrário de todos os demais queijos. Para quem conhece, o Morbier é facilmente reconhecido por ter uma linha mais escura que corta o queijo longitudinalmente. Pois bem, o responsável pela seção de queijos mandou fatiar todos os Morbier exatamente naquela linha! Aaaaarghhh!!! Mostra bem o quanto esse cara entende de queijo!
Morbier
Parte superior do formulário
Parte inferior do formulário
Morbier é um queijo de sabor suave produzido na pequena cidade francesa de Morez, situada nos montes Jura e bem perto de Genebra, Suíça.  

Durante a sua produção, de noite, o fabricante coloca um pouco de fuligem sobre a massa do queijo para impedir a formação da casca e manter os insetos longe dos queijos. No dia seguinte cada duas metades são juntadas e prensadas para montar o queijo final, que é maturado por dois meses. E é essa fuligem que dá o risco escuro na parte central, marca registrada do Morbier.
A linha escura é a característica mais marcante do Morbier
Durante o processo de maturação o queijo vai ganhando uma casca e, ao final do processo, é lavado com água salgada. Tem coloração levemente amarelada, com uma casca suave e miolo macio, sem chegar a ser cremoso. Harmoniza bem com Chardonnay e Pinot Noir.

Mas quando for comer um Morbier, PELAMORDEDEUS, não me mate de vergonha! JAMAIS corte a fatia na linha escura do queijo!!!
JAMAIS corte uma fatia de Morbier em sua marca escura!
Bon appétit!!!


quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

Oeste dos EUA 2014 – Uma cidade fantasma

Veja também os demais posts da série “Oeste dos EUA- 2014”: Dia 0, “Começou torto!”, "Rota 66", "Navajo Nation", "Um lago ancestral", "Pelas frestas do Arizona" e "Manzanar, uma vergonha americana"

 
Bodie é a maior cidade fantasma dos EUA! Localizada a leste da Sierra Nevada, Califórnia, a uns 480km de San Francisco, é tão importante que é reconhecida como marco histórico nacional.
Bodie e o oeste dos EUA
Apesar de ser um parque histórico estadual da Califórnia, recebendo cerca de 200.000 visitantes por ano, é administrada por uma entidade privada, a Bodie Foundation. Um exemplo que poderia ser seguido pelo Brasil.
Uma foto de Bodie ao redor de 1890
A história de Bodie começa em 1859, como um campo de mineração de pouca importância, tocado por um pequeno grupo de garimpeiros. Entre eles estava Waterman Bodey, o primeiro a descobrir ouro na região. Bodey jamais ficou rico e veio a falecer pouco depois, durante uma nevasca, sem nunca chegar a ver a prosperidade da cidade que levou seu nome.
O boom de Bodie demorou e só chegou quando uma mineradora descobriu um rico veio de ouro. Em 1879, Bodie tinha uma população de quase 10000 pessoas e cerca de 2.000 edifícios. Conta a lenda que, em 1880, Bodie chegou a ser a terceira maior cidade da Califórnia, algo bastante improvável.
No seu auge, Bodie chegou a ter instalações de cidade grande tais como uma agência do Wells Fargo Bank, quatro unidades de bombeiros voluntários, orquestra, estrada de ferro, vários jornais diários e uma prisão. Sua Main Street concentrava 65 saloons.

Bodie não era apenas uma cidade rica. Era uma cidade de luxúria e selvageria! Obviamente toda essa prosperidade também trazia consigo, com bastante frequência, assassinatos, tiroteios, brigas de bar e assaltos de diligências, assim como um popular e clandestino distrito da "luz vermelha", na extremidade norte da cidade.

Diariamente os garimpeiros saiam das minas direto para os bares e bordéis para gastar o pouco que tinham ganho. A mistura de dinheiro, ouro e álcool era frequentemente fatal.
Como tantas outras cidades do ciclo do ouro, a prosperidade foi embora tão rápida quanto chegou. Ao final de 1880, ouro mais farto era encontrado em Montana, Arizona e Utah, atraindo a horda de aventureiros "get-rich-quick" (fique rico rápido) de Bodie
Apesar das minas locais ainda estarem bastante produtivas, sua população continuou declinando até chegar a apenas 90 habitantes em 1940.
Em 1915 já era considerada uma cidade fantasma e a última mina fechou as portas em 1942. Com ela veio o vandalismo ao que restou da cidade, hoje com 110 edificações.
Visitar Bodie é uma viagem no tempo. É transportar-se para o final do século XIX, a época mais importante do Velho Oeste americano, e pousar em uma autêntica cidade do ciclo do ouro da Califórnia. Ao andar por Bodie, deixe sua fantasia voar!
Conta a lenda que, ao se mudar de San Francisco para Bodie, uma garota escreveu em seu diário "Good, by God, I'm going to Bodie" (Que bom, meu Deus, estou indo para Bodie).
Uma outra versão, bem menos santa, afirma que essa anotação dizia "Goodbye God, I'm going to Bodie" (Adeus Deus, estou indo para Bodie).
Decida você mesmo qual a versão mais apropriada!

terça-feira, 15 de dezembro de 2015

China: Tudo é muito relativo!



Veja também os demais posts da série "China": "Chegando a Tatooine" e "Filho único"

Você acha Belo Horizonte uma cidade grande? Sua resposta será certamente SIM! Com 2,5 milhões de habitantes, sem dúvida alguma BH é uma cidade grande... para os padrões brasileiros! Como assim?!!!
Mapa da China
Pois é, tudo é muito relativo neste mundo. O que é muito para uns, pode ser pouco para outros.

A China, um país com mais de 1,3 BILHÕES de habitantes, tem padrões que fogem à nossa capacidade de compreensão!
Muçulmano chinês na Cidade Proibida
Em nossa viagem à China, em 2015, visitamos Suzhou, uma cidade que fica perto de Xangai, famosa por ser a Veneza da China. Suzhou tem 5 milhões de habitantes, o DOBRO de Belo Horizonte, e é considerada uma cidade pequena para os padrões chineses. Ou seja, se fosse na China, BH seria, digamos, uma “vila”! Só rindo!!!
Guarda - Muralha da China
Pequim e Xangai são cidades grandes, com 21 e 24 milhões de habitantes, respectivamente. Pequim é uma cidade espalhada, com grande área urbana. Já Xangai é mais concentrada com um número bem grande de belos arranha-céus.
Mas a grande maioria das pessoas que trabalha nessas cidades vive nos subúrbios (cidades satélites), como Suzhou, conectadas ao centro dessas metrópoles por trens e metrôs. Só para dar uma ideia da complexidade dessa movimentação de pessoas, saiba que o metrô de Pequim chega a transportar mais de 11 milhões de pessoas diariamente.
Tocando e cantando nos parques de Pequim
Isso não significa que, com toda essa multidão andando embaixo da terra, o trânsito de Pequim seja a “última coca-cola do planeta”! Muito pelo contrário. É caótico, desorganizado e super congestionado... tudo isso, obviamente, em proporções chinesas. Um paulistano certamente se sentirá em casa!
Barqueira de Suzhou
Lembra daquela visão de um mar de bicicletas cruzando as ruas de Pequim? Cheguei com essa lembrança romântica, louco pra tirar umas fotos desse mar de bicicletas e me estrepei! É uma imagem que faz parte do passado. O que se vê agora é um mar de carros... que causam uma poluição de nível MUITO maior que a que um paulistano está acostumado a enfrentar.
Mar de bicicletas, uma imagem que ficou no passado
Apesar dos avanços econômicos chineses terem sido marcantes, a vida fora das grandes cidades, nas zonas agrícolas, ainda é marcada por muita pobreza. Tal como no Brasil, a migração para áreas urbanas é gigantesca. Mas você não verá um único pobre ou pedinte nas ruas de Xangai ou Pequim, que são muito limpas se compararmos com os padrões encontrados em toda a América Latina.
Monge budista
Segurança?! Poucas vezes me senti tão seguro circulando em uma cidade com milhões de habitantes. E olha que eu já estive em mais de 50 países!

Você deve estar imaginando que essa segurança seja mantida por milhares de policiais fortemente armados. Nananinaná, meu caro. O porte e a posse de armas são proibidos na China. Raros foram os policiais que encontramos e nenhum deles portava arma.
Vendedor de souvenir - Muralha da China
Já que estamos falando em proporções chinesas, você pode imaginar o tamanho do Aeroporto Internacional de Pequim? Não, não pode! Seu tamanho supera o de qualquer outro aeroporto onde já estive. É o terceiro maior do mundo, recebendo cerca de 30 milhões de passageiros ao ano. Um aeroporto simplesmente gigantesco e de uma beleza incrível.
Pra finalizar, uma curiosidade. Faz quanto tempo que você não vê um Santana, aquele carro que a Volks brasileira lançou em 1984 e retirou do mercado em 2005?! Pois é, ele continua vivinho e saudável na China. Aposto que se você pegar um táxi em Pequim ou Xangai, muito provavelmente ele será um saudoso Santana.
Senhora - Suzhou
Morto no Brasil, vivo na China. Como já disse, tudo é muito relativo!

terça-feira, 8 de dezembro de 2015

Grã-Bretanha – Strathisla



Veja também o outro post da série “Grã-Bretanha”: “British Museum



Em 2014 fizemos uma maravilhosa viagem à Grã-Bretanha. Uma viagem completamente fora do tradicional circuito turístico.
Mapa da Grã-Bretanha
Conhecemos muitas pequenas cidades da Inglaterra e Cornualha, mas, de tudo que vimos, a Escócia é, sem dúvida alguma, o mais bonito. Tá legal que o tempo não colaborou muito. Esteve nublado e com chuva boa parte da viagem. Mas assim é a Grã-Bretanha. Chuva e tempo nublado fazem parte do cotidiano do britânico.
Uma visita imperdível
Além de dezenas de castelos seculares, a Escócia é também sinônimo de uísque. Pra quem curte, um passeio imperdível! Não sou fâ de uísque, mas visitar uma destilaria era algo que estava no nosso plano de viagem. Valeu a pena!
Strathisla é a mais antiga destilaria da Escócia
Escolhemos a Strathisla, destilaria que fabrica o malte que é base para o famoso uísque Chivas Regal. É também a mais antiga destilaria em funcionamento na Escócia, produzindo desde 1786, tendo sido comprada em 1950 pelos Chivas Brothers para garantir a produção do malte mais importante no blend do seu uísque.
Mary e meu irmão Beto na entrada da linha de produção
O nome Strathisla significa “vale do rio Isla”, em celta. Lá aprendemos coisas curiosas a respeito da fabricação de um malte.

O processo se inicia com a torrefação e moagem da cevada. Depois disso se junta a turfa e a água pura proveniente de nascentes da região. Depois do processo de fermentação, é feita a filtragem e inicia-se a fase de destilação.
Câmaras de fermentação
O bagaço é transformado em alimento para o gado. Gado alimentado por rejeito de Chivas Regal deve ser muito chique, concorda?!!

O líquido destilado se divide em 3 partes “cabeça”, “coração” e “pé”, conforme o seu teor alcoólico. Apenas o coração, que contém o correto teor alcoólico é aproveitado. Do que é descartado, parte volta a ser destilada para fazer um aguardente de uísque.
Torres dos alambiques
Produto de uma dupla destilação, o malte que sai do alambique é tão claro quanto qualquer cachaça. Sua cor dourada é adquirida no processo de envelhecimento em tonéis de carvalho.
Armazéns de envelhecimento
Outra coisa curiosa é a respeito de seu sabor. Ao contrário do que eu imaginava, o sabor é proveniente do formato da torre de destilação do alambique. Torres mais altas, mais baixas, mais bojudas... cada uma dá um gosto diferente ao malte destilado. Jamais imaginei isso. Isso significa que, cada vez que a destilaria aumenta a sua capacidade de produção, o novo alambique tem que ser milimetricamente igual aos demais para que não haja qualquer variação no seu sabor.

O líquido destilado será então armazenado em tonéis de carvalho, que já foram usados anteriormente para armazenar bourbon ou xerez, e envelhecido.

40 diferentes maltes fazem parte do uísque Chivas Regal, inclusive o conhecido Glenlivet
O Chivas Regal é um uísque resultante da mistura (blend) de mais de 40 diferentes maltes. Curiosamente, com o fechamento de algumas destilarias ao longo dos anos, a receita de um uísque vai tendo que ser adaptada, para evitar uma alteração sensível no aroma e sabor que sempre notabilizou aquele produto.

Apesar da maioria dos armazéns de envelhecimento da Strathisla serem modernos, o antigo ainda é mantido, principalmente para visitação. Foi esse que visitamos... e o cheirinho de malte pairando no ar é delicioso.
Os maltes são envelhecidos em tonéis de carvalho usados para armazenar bourbon ou xerez
Delicioso e perigoso! Como esse cheirinho é proveniente da evaporação do malte armazenado nos tonéis, o teor de álcool no ar é muito alto e pode fazer alguém se embriagar sem ter tomado uma única gota de uísque!

No processo de envelhecimento, cada tonel perde cerca de 2% do seu conteúdo ao ano. É o que chamam a “parte do anjo” (angel’s share).
Toda visita tem que terminar numa degustação, concorda?!!
Vimos um tonel de 60 anos de idade. No seu interior, apenas cerca de 30% do seu conteúdo original, aguardando um evento super especial para ser usado: a coroação do próximo soberano britânico.

Nesse momento a Chivas produzirá uma edição especial de uísque que deverá custar a bagatela de 50000 libras esterlinas CADA GARRAFA. Algo como R$ 281500,00. E aí, vai comprar quantas?!!!
Passeando pelas instalações da destilaria
A visita terminou, obviamente, com uma degustação. Provamos os uísques de 8 e 12 anos e os maltes sem e com envelhecimento. Uma experiência fantástica! Não deu outra, saímos de lá com uma garrafa de Strathisla debaixo do braço.

Manja aquele lema, “beba com moderação”? Foi exatamente o que fiz. Tomava o meu precioso Strathisla em doses de “conta gota”!
Antigo moinho
Fui tão sovina, mas tão sovina que o Ômi Lá de Cima me obrigou a abrir mão dessa preciosidade e presentear a um amigo.

Voltando de Miami, embalei tudo, mandei as caixas para a transportadora e me piquei para o Brasil. Acontece que o transporte de líquidos é proibido e a garrafa foi retirada da caixa. Melhor para o grande amigo e guitarrista Gil Lima, que herdou a garrafa e irá consumir por mim! O novo dono merece! Faça bom uso, Gil!!!
Eu e a Mary visitando a destilaria Strathisla
PS: Desapega, desapega...Lição aprendida, Amado Mestre!!